Vivenciar o racismo na infância pode levar a criança negra a problemas como rejeição da própria imagem e baixa autoestima, além de outros impactos diretos no desenvolvimento infantil. Os dados são da publicação “Racismo, Educação Infantil e Desenvolvimento na Primeira Infância “, lançada recentemente pelo Núcleo Ciência pela Infância (NCPI).
No mês da Consciência Negra, o debate sobre políticas públicas que possam combater essa prática é ainda mais pungente. Essa discussão envolve a universalização dos direitos humanos, a redução das desigualdades socioeconômicas e a qualidade da educação infantil, que agem como fatores de inibição e erradicação desse problema.
O estudo, coordenado por Lucimar Dias, pedagoga e Professora Associada da Universidade Federal do Paraná (UFPR), mostra que a educação infantil é um dos primeiros e mais importantes ambientes de socialização da criança e é nesse espaço que ocorrem as interações sociais que impactam diretamente o desenvolvimento dos pequenos. Nesse contexto, relações saudáveis podem contribuir positivamente para a aprendizagem, enquanto experiências negativas são prejudiciais.
Um dos principais impactos dizem respeito à aceitação da imagem da criança nessa fase da vida. É na primeira infância que o ser humano começa a notar as diferenças físicas. Sendo assim, é fundamental que a criança se sinta aceita, acolhida e valorizada. “Quando a criança passa por uma situação de racismo ela pode construir um sentimento de desvalorização, rejeição da própria imagem, inibição e dificuldade de confiar em si mesma. Isso afeta o seu processo de socialização”, explica Lucimar.
Além disso, o racismo traz implicações negativas para a saúde mental de crianças e adolescentes, como maior incidência de sintomas de ansiedade e depressão. “Também não podemos deixar de elencar outra consequência dessa discriminação: o estresse tóxico. Essa situação pode interromper o desenvolvimento saudável do cérebro e de outros sistemas do corpo, aumentando o risco de uma série de doenças”, comenta a pesquisadora.
Estudos sugerem que doenças cardiovasculares, obesidade, diabetes tipo 2, distúrbios respiratórios e imunológicos podem ter raízes em adversidades vividas na primeira infância, como o racismo.
Papel da educação infantil
A educação é um importante espaço na luta contra o racismo. Nesse ambiente, diferenças como cor da pele, tipo de cabelo e gênero afetam a socialização, contribuindo para a aproximação, aceitação ou proibição em um grupo social. Nesse sentido, é importante que os educadores estejam preparados para identificar situações de risco.
“Estudos têm demonstrado que formações de professores voltadas à educação das relações étnico-raciais e com valorização da cultura afro-brasileira leva os profissionais a mudarem e estarem mais atentos a necessidades pedagógicas que respeitem a identidade racial negra”, diz a pesquisadora.
Por outro lado, a não inclusão de questões de raça como uma variável fundamental na formação dos profissionais da educação infantil permite que crianças negras deixem de ser protegidas neste ambiente, o que prejudica a construção da identidade positiva delas.
Vale ressaltar que, no Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNE) instituem a obrigatoriedade da inserção da cultura afro-brasileira e africana nos currículos e incluem a educação das relações étnico-raciais. Essas normativas, se bem incorporadas, ajudam a combater o racismo nas interações sociais das crianças e ajudam na construção de identidade negra.