Quando o Dia dos Pais foi instituído no início do século XX nos EUA, ser pai significava apenas conseguir gerar muitas crianças, mas a coisa mudou gradualmente e esse papel ganhou novas nuances sociais.
Carmem Miranda cantou no “Dia dos Pais de Família” em Nova Iorque, em 1939. Como destacava a reportagem da revista O Cruzeiro na época, os estúdios de Hollywood já não consideravam um “segredo horrível” o fato de galãs serem também pais orgulhosos.
A figura do pai começava a ganhar charme! Início de um processo de humanização do masculino, talvez. Quem se lembra do gesto de Bebeto em homenagem ao filho recém-nascido ao comemorar um gol na Copa de 1994?
De lá para cá, as expectativas em relação à paternidade só cresceram. Não basta mais ser o provedor ausente. Nem mesmo o pai participativo ficou livre das críticas. Como Fábio Júnior deixou claro na letra de “Pai”, espera-se que pai e filho sejam “muito mais que dois grandes amigos”.
Um pai precisa demonstrar genuíno envolvimento emocional. A demanda afetiva, porém, compromete a imagem idealizada o “pai herói”. Visto de perto, suas falhas ficam todas aparentes e as vulnerabilidades que o tornam mais humano enfraquecem sua autoridade. Daí o dilema do pai contemporâneo.
O papel tradicional do pai é ensinar o caminho entre as coisas do mundo e se assegurar de que o filho ficará bem. Contudo, em tempos que mudam muito rapidamente, o pai não tem mais competência para orientar (melhor contar com o ChatGPT para isso). Ele perde assim sua autoridade paterna original. Seu papel passa a ser, então, o de uma mão na hora que o filho tropeçar.
Portanto, o dilema apresenta sua própria solução: a nova paternidade se funda sobre vínculos de afeto. A autoridade baseada na competência se transforma em autoridade baseada no cuidado. Nesse caminho, talvez o papel do pai tenha ficado mais parecido com o da mãe.
Assim, o pai se torna merecedor de um dia em sua homenagem não porque sabe de tudo e não deixa faltar nada, mas porque se importa com seu filho e está disponível para acolhê-lo sempre que for preciso. Feliz Dia dos Pais então para aqueles que se importam e acolhem!
* Marcia Esteves Agostinho é doutoranda em História das Emoções e autora do livro “Por que Casamos” (Editora Almedina, 2023)